sábado, junho 20, 2009

licença literária: o cavaleiro inexistente

O livrinho é uma jóia. Um romance de cavalaria às avessas, que conta a estória do cavaleiro Agilulfo Emo Bertandino dos Guildiverni e dos Altri de Corbentraz e Sura - o cavaleiro da impecável armadura branca e que na verdade não existe - a partir da pena e penitência atribuída a uma freira confinada num convento. Curtinho, leve e muito bem humorado. Ótima leitura de fim de semana.

Extraí do texto integral um trecho que a mim disse muito. Muito mais do que o que está escrito, muito mais do que o contexto a que se refere. O que é a vida de cada um de nós senão um livro vazio aguardando por ser inteirativamente escrito? O que é a estória de cada dois, senão um livro a ser escrito a quatro mãos?

"Começa-se a escrever com gana, porém há um momento em que a pena não risca nada além de tinta poeirenta, e não escorre nenhuma gota de vida, e a vida está toda fora, além da janela, fora de você, e lhe parece que nunca mais poderá refugiar-se na página que escreve, abrir um outro mundo, dar um salto. Quem sabe é melhor assim; talvez quando escrevia com prazer não era milagre nem graça: era pecado, idolatria, soberba. Então, estou fora disso tudo? Não, escrevendo mudei para melhor: consumi apenas um pouco de juventude ansiosa e inconsciente. De que valerão estas páginas descontentes? O livro vazio não valerá mais do que você vale. Não há garantias de que a alma se salve ao escrever. Escreve, escreve, e sua alma já se perdeu."

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